Moya leva a lolita ruiva para um boteco pé sujo, mostra uma outra cara do Rio e seus valores. Joga uma sinuca, vai pra casa dela, dá café na cama e tudo mais. Confira o segunda parte dessa trama sagaz.
Meu maior defeito? Sou péssima companhia. A pior. A ruivinha quer surpresas. Nada de um macho tentando encantá-la. Se fosse pra levá-la num bar chique, pedir um cosmopolitan, sex on the beach ou qualquer outro drink, eu estaria indo para um lugar comum. Todos esses marmanjos sem originalidade fazem isso. É preciso se destacar. Ser assunto de mesas de bar e inesquecível. Todo mundo quer camarote e combo de vodka com energético. Eu? Eu quero o pior/melhor porre da minha vida. E luto por isso diariamente. Eu vivo cada dia como se não existisse a ressaca.
Bar ruim, podrão, são os melhores
Levo a ruivinha para um sinuca escondida em Botafogo. Nada demais. O ambiente é cinematográfico. Há um clima de submundo. Fumaça no ar. Cheiro de maconha. Luz fraca. Mesas de bilhar para todos os lados. Só aceitam dinheiro. Cerveja barata. Música boa. Se for pra viver na merda, que ao menos seja com música boa. Imediatamente escorrego cinco reais na mão do DJ. Com essa grana dá pra jogar sinuca por uma hora ou duas latinhas. Peço Rubber Soul dos Beatles.
Créditos: Leonardo Brelaz
É aqui que me diferencio, leitor. Trouxe ela pro meu lar. Bilhar. Cerveja. Veludo. Sem o pseudo-intelectualismo de White Album. Sem o comum do A Hard Day’s Night. Ela se diverte. Deixo as bolas dela na caçapa. Cada sorriso é um passo para a conquista. “Baby, you can drive my car”. Pra ela é novo. Nunca esteve aqui. A única ruiva natural do ambiente. Um destaque. O corpo esguio rindo e se fazendo feliz em cada tacada. Eu só conto piadas. Nada de mim. Para cada gole dela, a certeza de que estou no caminho certo.
Bebida, o dom da liberdade
A bebida tem esse dom de nos deixar libertos. Amansa demônios. Trazem leveza ao corpo e mente. O torpor é gostoso. O corpo dança. A ruivinha acompanha. Ela gosta de Beatles, mas nunca tinha ouvido o Rubber Soul. É aqui que me diferencio. Basta o básico. Feijão com arroz bem temperado é melhor que bolinho de bacalhau sem sal, leitor.
É numa dessas que roubo um beijo. Num vacilo dos olhos. A perna da ruivinha cambaleia. Eu vou com calma. Esqueço as horas. Aqui a paciência é arma. Cada segundo lento e aproveitado vale mais que cada minuto adiantado, apressado. E eu sou o buda da putaria. Confia em mim, leitor gafanhoto, essa é a melhor tática.
Fim de noite, hora da tentativa do abate
Créditos: Vit Vitali vindu
Já é quase manhã e a sinuca vai fechar. Somos expulsos pelos bêbados. Ela sugere irmos à sua casa no Jardim Botânico. Eu imaginava algo assim mesmo. Essa galera com dinheiro adora um maldito. Charles Bukowski. Jack Kerouac. Camiseta do Ramones. Short jeans desfiado. Música indie. Essa galera não surpreende. Tanto do mesmo. É um espaço preenchido pelo ordinário. A pessoa quer ser diferente e copia tudo de um grupo específico de pessoas. Sabe qual o nome disso? Mediocridade.
As pessoas vazias são mais interessantes que as medíocres. O vazio dá possibilidade. O branco do papel. Uma sala a ser mobiliada. Um prato a ser servido. A expectativa de poder preencher o nada com algo é mais interessante que ser bombardeado com o qualquer.
Ainda assim, as pessoas são como o Gato de Shrödinger. Você não sabe até abrir a caixa. Para ela, eu sou um fato inédito. Uma loucura que será esquecida. Não preciso explicar com detalhes, mas transamos. Olha, querido leitor, de todas as coisas que eu faço bem na vida, sexo oral é com certeza uma dessas. Aprendi desde cedo que a mulher merece a preferência. Sempre. É questão de educação.
Essa juventude…
Talvez esse seja o problema dessa juventude. Por isso temem tanto a Valesca Popozuda. Uma mulher que sabe o que quer e que exige do homem toda a propaganda que ele faz. Dá medo aos fracos. Mulheres de personalidade. Não há babaca que dê conta. Altruísmo: essa é a minha lição para os convictos de si. Menos segurança, mais entrega. “Enquanto eu tiver língua e dedo…” – diria o poeta.
Vou além. Durmo com a ruivinha. Acordo cedo. Compro o café da manhã na rua e sirvo na cama. Sim, leitor, é clichê. Eu sei que assistimos isso em todos os seriados e filmes americanos. Só que isso é uma arte esquecida. Saber fazer um ovo mexido molhadinho. Ou um frito com a gema bem molinha. O sal. A pimenta. O cheiro verde. O ponto ideal da torrada. Escolher laranjas doces e com bastante suco. Lavar a louça. Saber servir. Artes que o homem moderno perdeu quando optou pelo micro-ondas.
Quem sabe fazer ganha ponto
Créditos: Hartmut Nörenberg
Ela se encanta. Comigo é assim: transo e dou A comida. É bom repor as energias e os líquidos. Combater a ressaca e começar bem o dia. Café da manhã é a segunda refeição mais importante do dia. Perde só pro happy-hour.
Os elogios saem da boca da ruivinha com cada garfada que entra. “Nossa, cara, você é foda!” – ela diz enquanto mastiga. Pronto. Era o que eu precisava. É como ouvir o apito do juiz e ver seu time campeão. Toda a noite de ontem para chegar a esse momento. Eu sou foda. Pior. Eu sou ruim. Por mais bela que a ruivinha seja. Por mais feio que eu seja. Não preciso de mais nada. Conquistei o que queria. É hora de ir para casa.
Sem direito a foda matutina, deixo a ruivinha carente na cama. Minto sobre um compromisso. Vou embora. Não dá pra ser uma pessoa boa. Não dá pra ser boa companhia. Nasci ruim e morrerei assim. Ruim. Talvez esse seja o meu charme. Talvez esse seja a razão do meu sucesso com as mulheres inseguras.
Não há calcanhar-de-aquiles maior que ser uma pessoa boa. Sei muito bem sobre isso.