Já ouviu falar na Tiquira? Uma bebida típica de Maranhão pouquíssima conhecida no Brasil. É uma aguardente forte e que possui suas lendas locais bem bizarras.
Créditos: Igor Moraes
A primeira impressão já é impactante: a bebida é roxa e lendas ao seu respeito dizem que se você tomar banho depois de tomá-la pode até morrer. Incrível, não? Trata-se da Tiquira.
Bebida nativa do estado do Maranhão (de onde vem também o Guaraná Jesus) a Tiquira tem uma graduação alcoólica que vai às alturas, de 36 a 54º GL, é pra só pra homi e mulé macho, sinsinhô!
Índios, festas e tangerina!
Créditos: dereckesanches
Tudo começou, com os índios que já tinham um conhecimento apurado de bebidas a base de mandioca ou milho.
O intuito era comemorar o fim das batalhas entre tribos ou colheitas vindouras, e a produção da bebida ficava a cargo das mulheres, que recebiam seus guerreiros com elas em forma e honraria. Contudo a presença era restrita, conforme a tradição, mulheres no período menstrual poderiam estragar a bebida.
A presença de informações históricas sobre a tiquira é realmente modesta, e dois fatores contribuem para isso: sua limitação geográfica, já que é produzida essencialmente no Maranhão e o preconceito que a cercou, uma vez que era consumida, depois dos índios, por escravos.
A sacada da bebida está essencialmente na cor de aspecto Pinho Sol dela; para diferenciar das cachaças comuns ela é fervida com folhas de tangerina produzindo seu efeito arroxeado.
E como se faz essa Tiquira?
É claro que eu não ia deixar vocês sem a parte legal, a produção da nossa “braba” é longa, mas pode valer a pena! Só que você vai precisar ir muito além da sua cozinha pra produzir.
Arranje uma mandioca, lave, rale e prense ela. Esse processo garante que um componente químico, o ácido cianídrico dê o fora e isso é bem importante. Disso vai resultar uma massa, que é desfeita a mão dando origem a uma farofa grossa, e o que você deve fazer é espalhá-la sobre uma chapa quente, até que você consiga formar “bolos” de cerca de 30cm de diâmetro, e deverão ser assados até ficarem completamente cozidos, quando tiver pronto isso ganha um outro nome: beijus.
Espere os beijus resfriarem, expostos ao ar e na sombra. Vai acontecer uma proliferação espontânea dos esporos e dos fungos do ambiente e três ou quatro dias após isso aparecem sobre eles uma flora de micélios, de cor rosada.
Achou muito?
Você vai ter que esperar, na verdade, de 12 a 14 dias que é quando diminui o teor de umidade dessas massas e os micélios da superfície chegam ao interior dos beijus, contaminam e sacrificam a massa desdobrando todo o amido.
Créditos: Túlio Tsuji
Vá atrás de um concho que não é nada mais, nada menos do que um tronco de árvore escadado que deve ter 200 litros de capacidade coberto com água e jogue os beijus lá. No dia seguinte estará uma massa desfeita e xaroposa que deve ser mexida e agitada (é isso mesmo que você leu, mexer tudo dentro do tronco) para uniformizar e arejar o mosto, que deixado exposto completará sua fermentação em 2 dias.
Terminada a fermentação o mosto é destilado em alambiques de barro ou de cobre, e em cada operação vai de 15 a 20 litros de tiquira o que dá cerca de 100 litros, no total.
Se você quiser se ainda mais cuidadoso dá para coar o mosto antes da destilação, o que elimina o gosto desagradável da piroginação da parte lenhosa que fica no fundo do alambique por receber fogo direto.
Além de ser macho pra tomar tem que ser pra fazer. Ainda hoje, pela pequena produção da bebida não há controle ou fiscalização oficial apesar da orientação do SEBRAE de tentar profissionalizar esse setor.
E agora, José?
Créditos: rodrigov
Agora é tomar banho antes de beber a tiquira e correr pro abraço! Guaraná rosa que nada, cachaça roxa é o que vira!
Há uma tentativa, por meio da secretaria de cultura do Maranhão e das agências de turismo em enfatizar a vinculação cultural da bebida como símbolo regional “indígena”. Cuidado aí! É bacana lembrar que apesar do fermentado de mandioca já está em terras brasileiras há muito, a destilação só chegou aqui com os europeus.