Rufião – O Rei do Rio: Capítulo 10

Acordo nu, amarrado numa cadeira diante de um grupo de soldados da Polícia Militar fardados, de máscaras de gás e sem identificações. O mais baixinho e magrinho deles se aproxima de mim.

Fudeu…

Policial jogando gás de pimenta

Créditos: Ricardo Bakker

  • – O senhor é o viadinho que tentou comer o cu do nosso querido e adorado líder? – pergunta-me
  • – Antes de tudo, sou contra a homofobia…

Um dos policiais joga gás de pimenta em mim.

  • – A gente também é contra homofobia. Aqui, na polícia, ninguém gosta de viado, comunista e liberdade de expressão.
  • – Senhor policial, homofobia não é isso o que você está pensando.

O policial joga novamente spray de pimenta em mim. Dessa vez, em cima dos meus órgãos genitais. Tenho que dizer que isso dói. Dói muito. Ainda mais sem poder coçar. Por outro lado, garanto que um spray desses elimina 90% das doenças venéreas existentes.

  • – Seu nome é Armando Moya, não?
  • – Sim, senhor.
  • – O senhor é ligado ao lenonício, não?
  • – Desconheço esse rapaz, senhor.

A volta por cima…

O policial me dá um tapa na cara e me explica que lenonício é um nome escroto pra cafetinagem. Eu confirmo que sou sim um empresário do mercado da libidinagem.

  • – Achou que ia ficar rico sem pagar a taxa pra polícia?
  • – Sabe qual o problema dessas cobranças policias? Não há tabela. Não há carnê. Cada batalhão é um preço. Cada policial uma cota. Cada zona uma avaliação errada de mercado.

Os policiais se entreolham, sem entender o que estou falando.

  • – Prossiga.
  • – Seu policial, se tem uma coisa que eu aprendi com o mercado é que não é legal mudar o preço conforme o cliente. Sim, eu poderia lucrar mais, porém, tratando todos de forma isonômica, ganho credibilidade com os mais ricos e com os mais pobres.
  • – Descreva “isonômica”, por favor – pediu o policial
  • – O senhor pode me dar um papel e me desprender? Eu posso desenhar pra você. Fica mais fácil.
  • – Puga, pega lá um papel e caneta pro Armando – pediu o homem que estava diante de mim, mais interessado no assunto
  • – Ôh, Comandante… fala meu nome não. Depois ele vai me dedurar. – Puga resignado disse isso enquanto saía para pegar papel e caneta.

O Comandante, que era o homem mais baixinho e magrinho do grupo, desamarrou o nó que prendia minhas mãos na cadeira.

  • – Fica tranquilo, Comandante. Eu já esqueci o nome do Puga – evito preocupações

Caveira e balança

Puga volta com papel e caneta. Eu desenho dois grandes traços, fazendo um sinal de igual. Eu mostro pra eles e pergunto o que eles enxergam. As respostas assustam.

  • – Dois corpos no chão – diz um
  • – Duas carreiras de cocaína – respondeu o Comandante
  • – Duas AK47 – responde o Puga
  • – Uma girafa lutando com um hipopótamo – disse o último
  • – Nada disso! – grito – isso é o sinal de igual. Sacam matemática?

Os policiais olham um para o outro como se dissessem “eu nem imaginava”. Eu continuo:

  • – Não importa se eu tenho um restaurante bom ou ruim. Chique ou simples. Eu tenho que criar um único cardápio, com preços iguais a todos. Se mudar os preços para cada esquina, pra cada cliente, eu vou perder um contribuinte da corrupção para um policial que sirva um produto mais porco e cobre menos.
  • – Então você sugere que…
  • – Veja, você é o comandante dessa corporação, não? – o Comandante diz que sim com a cabeça – Então… é uma questão de lógica. Trabalhar um sistema que todo batalhão e todo policial receba de forma igual e na mesma época.

Eles me olham desconfiados.

  • – Isso não é comunismo, Armando? – pergunta Puga
  • – Não existe coisa mais capitalista do que enriquecer com o trabalho alheio. Vocês fazem nada, cobram uma taxa e enriquecem. Quanto maior o status de vocês na corporação, mais vocês recebem. Com isso, vocês não espantam clientes, mantém apenas os grandes negócios vivos, facilitando as negociações e acabam com as competições entre vocês. Sem concorrência, assumindo esse monopólio da violência e da corrupção.

Os policiais se olham acham a minha ideia interessante. Eles se abraçam concordando com o que digo.

  • – Armando, quando eu joguei o spray de pimenta no seu pau, você não soltou um pio. Nessa hora eu sabia que estava falando com um homem de verdade.

E essa é a terceira regra da orgia. Não emitir sons quando algo dá errado.

Finalizando

Policiais saindo do presidio

Bora cambada!

Créditos: Pedro Pantoja

Puga solta meus pés e finalmente fico livre. Os policiais me abraçam, apesar de eu ainda estar nu.

  • – E agora? Após uma consultoria dessas, posso lhe conceder um pedido. O que você quer?
  • – Eu quero uma farda completa. Com arma e tudo. De preferência, de um tenente.

Agora vem a quarta regra da orgia.